quinta-feira, 14 de junho de 2007

XII

uma vez um amor acabara. ela se dera conta quando olhou com inveja um casal se despedindo na calçada, sete da manhã, um beijo suave mas intenso antes de cada um tomar seus ritmo e rumo e trabalho. nem se lembrava mais da última vez em que dera um beijo assim, rápido, e entretanto ansioso pela volta, pelo fim do dia. por que o amor chegara ao fim, perdera o direito à leveza, ao desejo mal contido e habitual de se ver de novo, dividir as histórias ridículas dos alunos, dos chefes, da empregada, da luminária nova, a escola dos filhos, sua tpm, as verduras do jantar. o amor se despedira tardiamente, mas se fora. ela se dava conta.
agora o via novamente, era capaz de reconhecê-lo, como fosse alguém que a esperasse de volta no aeroporto. trocaram um sorriso tímido, os olhos empapuçados de sono, e ela sabia que nunca mais precisaria invejar as despedidas dos casais nas manhãs geladas, aqueles dois à sua frente no tráfego da rua ainda vazia, as mãos custando a se separar. sabia que ele chegara mais uma vez, sentia tão profundamente sua presença que achou que talvez devesse agradecer a mágica. foi o que fez, o amor é como o mar. deve ser respeitado a qualquer preço, pois revolto, tormentoso ou calmaria, o amor é só imensidão e horizonte.
por isso o abraçou, e agradeceu-lhe por ter vindo para viver com ela mais uma vez, agradeceu-lhe silenciosamente pelo sorriso com que a acolhera na volta da viagem. disse-lhe para ficar, a vida podia ser imensa, e a sua era a segunda casa dele.