segunda-feira, 16 de julho de 2007

XIV

por meses não disse a ele que o tinha esperado, que algo nela era irremediavelmente dele. foi quando se sentiu olhada num raio x. não deu meia volta, decidiu que deveria mesmo dizer o que doía tanto nela - o horóscopo do sábado tinha dito para dividir o peso que a oprimia por dentro - horóscopos num jornal, ela os respeitava, sabe lá quando seria a próxima hecatombe. horas mais tarde viu-se tomada por aquela proximidade cirúrgica que lhe roubava o prazer, mas não eram olhos dele , eram os dela própria - os mais aterrorizantes - olhando para dentro da tarde sufocante de calor, de uma rudeza que ela afinal gostava. até que contou: começou dizendo do gosto, que se lembrava; depois provou de novo aquele gosto amargo. por causa do que restava sem dizer ficou outra vez com vontade de chorar, agora não, molly, por favor, esse vai se tornar o altar das lágrimas. até que falou vagarosamente, um fio comprido que ia puxando do estômago, às avessas. tudo fugiu à sua volta, exceto sua própria tristeza, que dessa nunca ia se livrar; exceto se lembrar de agradecer pelos dois, uma estranha boa sorte. para ela, desde sempre, o que é muito bom nasce do nada, do seu próprio negativo.

Um comentário:

OCSB disse...

para ele, desde sempre, o que é muito bom nasce do nada. não podia deixar de ler isso. e escrever isto.