sábado, 28 de julho de 2007

XIX

ainda bem que mabel não se esquece de outras distantes noites de sábado - tão terríveis - , quando dormia num quarto com papel de parede desenhado de rosas muito pequenas, um disco do legião que ela tanto queria ouvir e não encontrava seus fones de ouvido naquela bolsa imensa em que supunha tê-los trazido. não, já não podia mais escutar música como gostava, e legião se ouve alto, ponto final. sentiu pena de si mesma, não pôde evitar uma tristeza doída. mesmo que visse o quanto era ridículo sentir-se aprisionada por tão pouco. quis pegar a estrada de volta pra sua casa e buscar seus fones. quem sabe ficasse. mas era noite, o caminho longo, ficou com a própria solidão e impotência, cantarolou baixinho a tal canção. neste sábado sentiu de novo a velha tristeza, mas pelo futuro. um misto de alívio -é que não mais dizia respeito a ela aquela incapacidade de doação - e de alerta. mabel bem sabe que a si cabe o contraponto daquela brutalidade fora do lugar, na história que começara alguns anos depois que compreendeu - os desenhos tão delicados nas paredes daquele quarto antigo eram tão somente a figura de uma opressão dissimulada. sua tristeza, a desta fria noite de lua quase cheia, era pela inevitabilidade do destino das pessoas a que ama.

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